O coletivo não existe
A frase onipresente “Tem um jeito” permite reivindicar, aos olhos de um círculo mais fechado, uma certa forma de segurança, uma competência social comprovada – uma habilidade prática em uma situação. Isso tem tudo a ver com as análises de Luc Boltanski e Laurent Thévenot sobre as “justificações”. O bolsonarismo estaria intimamente ligado a uma “cidade familiar” e, ao mesmo tempo, a uma “cidade virtuosa”, dois filtros para pensar a “cidade da justiça”, que inclui o porte de armas e diversos tipos de vigilância generalizada[mfn]Essa vigilância acompanha ontologicamente os regimes autoritários. Nos últimos anos, a China produziu sistemas de vigilância em tamanha escala, que a queda de preços permitiu que instituições e particulares do mundo inteiro pudessem se equipar (Leplâtre 2023).[/mfn], em oposição a representações democráticas da “cidade das regras”, da “cidade do conhecimento”, ou mesmo da “cidade mercante”, que têm como corolário a primazia do real (e de complexidades que exigem uma argumentação formal) sobre os esquemas ideais, normatizados por valores e não por fatos. De fato, é tentador voltar a essas dimensões epistêmicas para entender por que, contra todas as evidências dos vínculos da família Bolsonaro com grupos de milicianos, “o bolsonarismo é um moralismo”. Essa grande lacuna autoriza todas as transgressões – na véspera das eleições, vimos uma deputada bolsonarista e seu segurança, ambos armados, perseguirem um jornalista negro ameaçando atirar nele; a cena foi gravada e certamente comoveu alguns eleitores, até então indecisos. Sobretudo, ela descarta qualquer obrigação argumentativa do tipo consequencialista: agir em prol de seus interesses imediatos é uma obrigação que não permite exceções. Agir de outro modo significaria submeter-se a forças incontroláveis, a uma metafísica social que privilegia o coletivo abstrato, face a relações concretas etc. Nesse sentido, é fácil constatar que: se a maioria dos brasileiros está impregnada da preocupação de errar e de não estar à altura das relações sociais, emancipar-se desse constrangimento leva alguns a redobrar seus esforços, tentando fazer com que uma nova provocação ainda mais agressiva cale qualquer possibilidade de reparação, mesmo que simbólica, de um erro anterior. Quanto pior, melhor. Evidentemente, este esboço bastante impressionista não pretende substituir uma análise circunstanciada – ele pretende apenas mostrar como o moralismo, o egoísmo e o golpe de Estado coexistem para pessoas comuns, cujas ações são facilmente telecomandadas e para quem o coletivo não existe. Cada um que fique com sua merda.
No alto escalão, não é difícil compreender com que interesses o retorno de Lula irá romper: a onipotência dos militares, para quem o governo Bolsonaro foi uma chance única que não se repetirá; os caciques locais, cujos favores serviram para atrair uma clientela de empresários interessados; as igrejas evangélicas e seus pastores, que jamais se beneficiaram tanto de meios e de liberdade para aumentar sua audiência e captar milhares de pessoas sensíveis à atração de comunidades fraternas, que supostamente acolhem os desafortunados e propõem uma redenção que a sociedade está longe de ser capaz de conceder. A lista de interesses econômicos e corporativistas lesados pelo retorno do controle democrático seria ainda mais longa. O caso dos eleitos que devem seu mandato a Bolsonaro é mais ambíguo: com o decorrer dos acontecimentos, eles serão a ponta da lança do processo de reconquista do poder; caciques locais indispensáveis, procurados pelo poder, ou atores derisórios, que perderão suas posições à medida que deixarem de conseguir captar fluxos financeiros. A tática política, que consiste em impedir a direita de abandonar Lula e bloquear as reformas desejadas por ele, está em perigo. A estratégia dos bolsonaristas de ir até as últimas consequências deve forçar seus aliados a se comportarem como conspiradores, completamente atados a atos do passado – uma abordagem completamente mafiosa. Sem dúvidas, o saque da Esplanada tensionou bastante essa linha e o estado-maior bolsonarista não poderá impedir a debandada, sobretudo quando é preciso negociar financiamentos federais para projetos locais ou de determinados setores econômicos.
Propaganda e propagação
Restará uma minoria resistente no Congresso, que tornará difícil a menor reforma e sempre negociará vantagens durante as votações. Ela fará questão de mostrar aos evangélicos e às redes sociais que existe uma legitimidade extraeleitoral – essa é a base para a retomada do poder nas próximas eleições. O bolsonarismo tem toda a probabilidade de se fundir com grupos de interesses evangélicos. Esses não têm outra aliança e servirão como base da reconquista, evidentemente ligada a influências norte-americanas, de quem são emanação direta. O pentecostalismo bolsonarista já é um componente da paisagem social brasileira e, provavelmente, sua ala mais móvel. Assim como na fácil vitória de Bolsonaro em 2018, 49% do eleitorado do dia 30 de outubro é composto de brasileiros reais que estão, em sua maioria, muito longe do menor cinismo: evangélicos ou não, eles acreditam na corrupção financeira do PT, recordam-se dos escândalos que as mídias nacionais mostraram à exaustão, veem em Bolsonaro um político contra o establishment (apesar de todas as evidências contrárias) e toleram sem problemas sua incompetência. Além disso, a ideia de um governo competente lhes é estranha, é um puro oxímoro (eles não conhecem esse termo): isso jamais existiu. Metade dos brasileiros continua a dizer que o novo governo não fará melhor que o anterior. Os anos 2000 estão distantes e lidamos essencialmente com autoridades locais, normalmente nada brilhantes.
Debateremos a implicação do estado-maior trumpista. Eduardo Bolsonaro foi recebido por Trump em Mar-a-Lago, após a derrota de seu pai. Dois anos antes, ele se encontrava em Washington, logo antes do ataque ao Capitólio, e ficou claro que Steve Bannon declarava apoio direto aos golpistas do dia 8 de janeiro nas redes – ele se via como padrinho da internacional da extrema direita … Contudo, isso não indica um complô internacional contra Lula. Haverá bolsonaristas nostálgicos distribuídos em todo o mundo e talvez até imitadores: tratava-se de uma demonstração de força, projetada para sair do controle, e as investigações mostrarão quem fretou os 150 ônibus dos manifestantes e qual era o plano associado às palavras de ordem que circulavam nas redes. O The Guardian selecionou, no mesmo dia, as fotos mais espetaculares publicadas na imprensa (Williams 2023). No Brasil, o proletariado digital dos entregadores a domicílio acompanhou a passagem direta da economia informal para a desinstitucionalização de muitos serviços. O sistema de pagamentos via telefones (PIX) resolveu tão bem a questão das microfaturas, que terminou adiando a modernização dos empregos, a partir do desenvolvimento de competências – essa constatação pode ser estendida a todo o planeta. Eis o paradoxo da modernidade digital: ela imobiliza as condições de trabalho e estrutura uma “armadilha da pobreza”, que aprisiona milhões de empregados sem recursos em funções de pura sobrevivência. Com a concorrência das vendas online, as grandes redes populares sofrem. No Brasil, as Lojas Americanas estão em falência e a Magazine Luiza perdeu 80% de seu valor na bolsa, enquanto o Mercado Livre aumenta sua participação no mercado.
A desmaterialização do comércio acompanha a relativa queda do poder de compra e é acompanhada, por sua vez, pela perda de competências em relação aos empregos da economia residencial. Uma imagem sintetiza essa situação geral: as cidades não atualizam a sinalização rodoviária para competir com os sites de circulação, fazendo com que os motoristas de Uber pudessem invadir a competência dos táxis, que diminuíram com o tempo. A qualidade da informação “residencial” está em queda. Resta ao trabalho humano ocupar o último elo da corrente, ou tomar seu lugar antes da etapa de distribuição, tornando-se programador ou prescritor dessas mesmas correntes de informação. Em ordem crescente de complexidade, é preciso atualizar os catálogos e as referências – embora uma boa parte desse trabalho seja feita automaticamente. A validação dos algoritmos já é mais complicada para as máquinas, mas esperamos que a inteligência artificial faça trabalhos de marketing ou de modificação dos processos – aqui são necessárias cabeças bem formadas e os empregos estão concentrados nas sedes das empresas ou em modos de trabalho pseudodistantes. O capitalismo digital deixa então poucas esperanças para os trabalhadores de base. Em uma espécie de loteria, alguns escaparão de sua condição frequentando locais de aprendizagem, até obter uma vaga qualificada em algum lugar – visto que são necessários inúmeros agentes de manutenção para todos esses sistemas digitais. Outros simplesmente desaparecerão das telas, uma geração supranumerária. Estamos bem longe do aparente trumpismo, mas é interessante ver Bolsonaro reivindicar – falsamente – a paternidade do sistema brasileiro de micropagamentos, afirmando ser o responsável pela entrada da economia informal no mundo digital. Qual é a relação que se estabelece com a Internacional das direitas, com a qual contribuem efetivamente os campeões do digital como Peter Thiel e Elon Musk? Digamos que o tema do desencravamento seja central para compreender o que liga os libertários entre si. Através de uma rotação semântica do tema social do empoderamento, os partidários do neoliberalismo digital veem os sistemas de micropagamentos como elemento capaz de liberar as iniciativas, sem que seja preciso recorrer a instâncias públicas.
Nos anos 1980, a acepção do termo empoderamento coincidia claramente com o sentido da palavra francesa “capacitation”[mfn]Capacitação.[/mfn], mesmo que essa palavra seja historicamente associada, em inglês, ao termo capability. A palavra foi notadamente difundida no contexto de uma estratégia de luta contra a pobreza que permitia, por intermédio da formação profissional, que sistemas de empréstimos favorecessem pequenos investimentos locais etc. Uma capacitação de indivíduos e de pequenas comunidades, destinada a permitir que exerçam um certo controle sobre as arbitrariedades e possam comandar sua própria existência. Tal situação remete particularmente às teorias de Amartya Sen, que deu lastro ao termo, a partir de seus estudos sobre os famintos na Índia e as condições para evitar que eles existam – o que inclui uma imprensa livre, capaz de informar e criticar (Sen 2022). A capacitação, entendida nesse sentido, decorre da community organizing promovida pela escola sociológica de Chicago.
Sen propõe comparações de utilidade interpessoal, baseadas em uma grande variedade de dados. Sua teoria trata do acesso a benefícios, entendido como o acesso individual a bens que satisfazem necessidades básicas (comida, por exemplo), liberdades (no mercado de trabalho, por exemplo) e capacidades. Nós podemos fazer escolhas sociais baseadas em variáveis reais e melhorar assim a situação inicial [mfn]No original em inglês: Sen proposes interpersonal utility comparisons based on a wide range of data. His theory is concerned with access to advantage, viewed as an individual’s access to goods that satisfy basic needs (e.g., food), freedoms (in the labor market, for instance), and capabilities. We can proceed to make social choices based on real variables, and thereby address actual position.[/mfn].
Esther Duflo sucedeu Sen na lista dos Nobel de economia que confrontaram o desenvolvimento desigual. No fundo, trata-se sempre de permitir que boas informações circulem e que sejam consideradas por aqueles que praticamente não tinham acesso a elas. Uma capacitação efetiva aproveitará muito da difusão das bases digitais – Sens public inscreve-se plenamente nessa dinâmica. Mas isso não pode acontecer se temos uma população analfabeta, desprovida de estruturas de saúde pública e isolada pela falta de transportes públicos acessíveis. É vão tentar traçar uma linha dos investimentos públicos, desde as redes que fazem a conexão com as bases de conhecimento, sem as quais nenhuma capacitação é possível, passando pelo saneamento e pela água potável. Acima de tudo, a história da sociologia urbana mostra que as funções centrais dos animadores sociais são essenciais, encorajando o apoio de pessoas cuja vocação é transmitir a informação necessária para ampliar as possibilidades dos habitantes de determinados bairros – evitando que caiam nas redes de delinquência. Estamos nos antípodas do desterro, da repressão e da segregação e certamente fazemos parte de um projeto de aumento da qualificação dos territórios, um trabalho de formiga.
Logo, a evolução das representações associadas ao conceito de empoderamento está longe de ser inocente. O artigo da Wikipédia em inglês, que trata dessa noção, após evocar a autoestima, cita Margaret Thatcher e Milton Friedman (outro Nobel), fundador do monetarismo e da crítica aos serviços públicos, cuja ação no Chile está diretamente ligada à origem das convicções de Guedes, o ministro da economia de Bolsonaro. Esse verbete expõe, de forma clara, que os economistas veem no empoderamento um retorno ao adágio “ajuda-te a ti mesmo e o céu te ajudará”, em oposição aos sistemas de amparo social, que eles dizem prender os pobres em uma lógica assistencialista. O conceito central já não é mais a capacitação, mas a noção curinga de oportunidade, que seria estar atento, adaptar-se e aproveitar as ocasiões que se apresentam, segundo um darwinismo social impenitente. Impossível ser mais direto: “a abordagem do empoderamento foca em mobilizar os esforços individuais dos pobres, mais do que em prover assistência social” (Empoderamento a)[mfn]No original em inglês, The empowerment approach focuses on mobilizing the self-help efforts of the poor, rather than providing them with social welfare.[/mfn]. A escolha da Comissão Linguística do Québec[mfn]Office québécois de la langue française (OQLF). Nota do tradutor.[/mfn] de traduzir empoderamento por autonomisation[mfn]Autonomização.[/mfn] põe em ação essa completa inversão, omitindo o contexto social do trabalho, que será substituído pela referência individualista da tomada de controle do indivíduo sobre sua própria vida: “sobretudo, o poder de indivíduos e de grupos sociais de agir diante das condições sociais, econômicas, políticas ou ecológicas com que são confrontados” (Empoderamento b). Embora haja uma referência à origem do conceito no contexto da organização comunitária, o que nos permite avançar para temas relacionados ao trabalho social, dentro da própria enciclopédia digital, não há nenhuma referência aos economistas do desenvolvimento – ou da escola libertária[mfn]Essa ideia é encontrada apenas na referência a um artigo de Anne-Emmanuèle Calvès (2009), que teve uma espécie de duplo redigido por Marie-Hélène Bacqué et Carole Biewener (2013)[/mfn]. Prolongar essa análise exigiria retornar ao sentido filosófico da noção de autonomia, notadamente codificada por Kant, no século XVIII – em alemão Selbstständigkeit. O artigo da Wikipédia em alemão (Empoderamento c), ainda que bastante sintético, é mais preciso. Nele, o empoderamento faz referência direta ao processo de emancipação, que visa permitir a autodeterminação dos sem poder. Ele não oculta o sentido sociopolítico do termo com um véu individualista e valida o significado de capacidade do mesmo.
Reduzir essa noção a um objetivo de desenvolvimento econômico, por intermédio de supostos automatismos do mercado, modulados por alguns corretivos indispensáveis, é portanto bastante reducionista, na medida em que retira o conceito de capacitação de um contexto em que as alavancas da transformação importam, inserindo-o em um contexto individualista, que prioriza a responsabilização dos indivíduos diante de seus destinos. Torna-se claro que, a partir da ideia de empoderamento/autonomização, os libertários advogam por um desenvolvimento de sistemas de forte valor agregado, em detrimento daqueles que imobilizam uma forte dotação de capitais públicos: o YouTube no lugar da escola pública, por exemplo; a atribuição individual da responsabilidade de aproveitar oportunidades profissionais e de cumprir responsabilidades sociais e familiares; a redução de impostos, em vez de incluir os custos adicionais da inclusão social, da formação profissional e da descarbonização da economia na formação dos preços da energia e dos custos empresariais. Tudo isso teria relação com o apoio aos evangélicos, com a estigmatização generalizada da incompetência e da preguiça, com a promoção do mérito e com o ceticismo climático? Cabe ao leitor julgar.
Os bolsonaristas incontestes se veem como arautos do futuro e caricaturam a esquerda como um fantasma oculto de um passado de corrupção. Ao lado dos ideólogos do Estado mínimo que acabamos de evocar, alguns ainda acrescentam uma dimensão sacrificial de tipo religiosa. Todos são hostis ao parlamentarismo. Essa última característica os aproxima do fascismo italiano de um século atrás, que embora sirva frequentemente como amarra interpretativa, era muito mais estatocêntrico, não venerava o mercado e buscava a autarquia econômica. Ele não desejava privilegiar os setores exportadores da economia, em um quadro de divisão internacional do trabalho. Mesmo que de fato esperem a encarnação do chefe carismático, eles querem sobretudo fechar o parêntese democrático aberto há quarenta anos, cujo fim era anunciado por Bolsonaro, ao descredibilizar as instituições. Essa é a filiação do movimento com a ditadura chilena dos anos oitenta, que foi certamente adaptada à sociologia brasileira. A ideia de que Lula possa restaurar essas mesmas instituições lhes dá completo horror! A campanha de Bolsonaro enviava uma mensagem subliminar ao eleitorado: “contem comigo para preservar o país que vocês idealizam e para simplificar sua existência, a partir de auxílios direcionados, de sistemas de pagamentos eletrônicos e do culto a virtudes tradicionais, mas jamais por intermédio das instituições – viva o plebiscito e o porte de armas, a proteção de nossa liberdade e de nossas crianças”. Seu concorrente era caricaturado como agente de supostas fugas de capitais para o estrangeiro, de profanação dos valores familiares e acusado de ser apoiado por uma dispendiosa burocracia de esquerda e pelo Supremo Tribunal Federal. Bolsonaro pontuava em seus discursos uma ode à liberdade incondicional, que garantia o porte de armas. Diante da ausência de mortes, no dia 8 de janeiro, ele e seus amigos disseram que as manifestações foram pacíficas – a intervenção sem excessos é mérito das forças da ordem e se não foram encontradas armas letais entre os manifestantes, isso sem dúvida se deve ao fato de terem recebido orientações. À medida que ocorrem os processos contra os autores desse dia funesto, o bolsonarismo permanecerá tema da atualidade, envenenando de modo durável o mandato de Lula. Será o presidente capaz de aplicar ao menos a pedagogia necessária para as reformas indispensáveis?
Por Gérard Wormser
Traduzido do francês por Luiz Capelo
Bibliografia
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Calvès, Anne-Emmanuèle. 2009. « « Empowerment » : généalogie d’un concept clé du discours contemporain sur le développement ». Revue Tiers-Monde. https://www.cairn.info/revue-tiers-monde-2009-4-page-735.htm.
Leplâtre, Simon. 2023. « Comment la Chine exporte ses outils de surveillance de masse ». Le Monde, janvier. https://www.lemonde.fr/economie/article/2023/01/11/comment-la-chine-exporte-ses-outils-de-surveillance_6157361_3234.html.
Sen, Amartya. 2022. Citoyen du monde. Odile Jacob.
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Williams, Michael. 2023. « Bolsonaro supporters storm Brazil’s political buildings – in pictures ». https://www.theguardian.com/news/gallery/2023/jan/08/bolsonaro-supporters-storm-brazils-political-buildings-in-pictures.