Revoluções conservadoras, ubers voadores, investimentos chineses milionários e grupos de WhatsApp. O que realmente acontece no Brasil em 2024? Ora, esses são alguns elementos que Gérard Wormser relaciona na elaboração de um quadro interpretativo capaz de elucidar as motivações dos atores sociais que marcaram a última década. A proposta de parceria entre a prefeitura de Mataraca, na Paraíba, e empresários chineses iluminou as interações entre as esferas econômicas, políticas, sociais e territoriais. O econômico impacta o território, ao mesmo tempo em que ele caracteriza os grupos sociais. As ações políticas se ramificam do mesmo modo que os projetos econômicos entre os níveis local, nacional e mundial. E as formas sociais também desvelam esses três componentes – tradições populares, orgulho nacional e assimilação de práticas globalizadas. Assim, a triangulação local, estado-nacional e mundial que condiciona a cidadezinha de Mataraca serve aqui também como instrumento de análise da democracia brasileira. Este texto foi originalmente publicado na revista Sens public[…]
O que se sabe do Brasil em 2024?
Neoliberalismo “clássico” e novo neoliberalismo
Pierre Dardot
No dia 28 de fevereiro, o Ministro Fernando Haddad discursou na abertura da Reunião Ministerial do G20 ocorrida em São Paulo. Ele abriu a Reunião porque o Brasil assumiu a presidência do G20 para o ano de 2024. Em seu discurso, o Ministro abordou temas como globalização, aumento da desigualdade e como “a integração econômica global se confundiu com a liberalização de mercados, a flexibilização das leis trabalhistas, a desregulamentação financeira e a livre circulação de capitais”. Eis que o texto de Pierre Dardot, anteriormente publicado na Sens public, mostra-se atual. Dardot discute como o neoliberalismo é um modelo que gere relações de imperium, a dominação sobre as pessoas, e de dominium, a dominação sobre as coisas. O neoliberalismo é mais do que um mercado que, hipoteticamente, autorregula-se. Os neoliberais clamam por uma constante regulamentação das relações de imperium e de dominium na qual o mundo é mais do que um mercado sem fronteiras e sem Estado, mas sim um “mundo duplo, preservado pelos guardiões da constituição econômica das demandas das massas em favor da justiça social e da igualdade redistributiva”. Assim, a ordem ecônomica neoliberal não pressupõe a abolição dos Estados nacionais ou de fronteiras (por que choras, Brasil Paralelo?). Pelo contrário, ela presume que os Estados nacionais se organizarão e criarão mecanismos capazes de impor a “racionalidade do capital”, e eis que surgem o GATT, a OMC, o G20, etc. Nesse contexto, Dardot traça a história do neoliberalismo e questiona se é possível a divisão entre neoliberalismo “clássico” e um novo neoliberalismo. […]
Neoliberalismo autoritário no Brasil
Daniel Pereira Andrade
Para compreender a virada autoritária do neoliberalismo no Brasil durante o governo Bolsonaro, o artigo examina como as reformas neoliberais se compõem com uma racionalidade política historicamente situada: a lógica militar da guerra ao inimigo interno. O artigo enumera, em primeiro lugar, os projetos de reforma neoliberal propostos pelo ministro da economia Paulo Guedes nos três primeiros meses de governo. Em segundo lugar, mapeia a participação dos militares no governo Bolsonaro e analisa o surgimento da lógica militar da guerra ao inimigo interno durante a Ditadura Militar (1964-1985), sua metamorfose em guerra às drogas ao longo da Nova República e sua atualização por meio das operações de “pacificação”. Por fim, o artigo mostra como as racionalidades neoliberal e militar se compõem na virada autoritária brasileira, criando, de um lado, reforço mútuo, e, de outro, bloqueios que colocam a democracia brasileira em xeque. Texto originalmente publicado no dossie Le néolibéralisme autoritaire au miroir du Brésil da revista Sens public. […]